Pacote de Moro endurece penas para crime organizado e corrupção

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Para reforçar o combate ao crime organizado e à corrupção, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, apresentou projeto de lei a ser enviado ao Congresso que altera 14 leis. Entre outras medidas, a proposta redefine o conceito de organização criminosa, incluindo milícias e facções que atuam em presídios, e também altera regras para progressão de regime. Em mensagem aos parlamentares na abertura do ano legislativo, o presidente Jair Bolsonaro disse que o governo “declara guerra ao crime organizado’’: “Não temos pena nem medo de criminosos”.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, apresentou ontem um projeto de lei que será enviado ao Congresso alterando 14 leis na tentativa de reforçar o combate ao crime e à corrupção. A pauta de 34 páginas traz propostas que incluem aumento de penas, prisão após condenação em segunda instância, mudanças no cumprimento de penas e na progressão de regime, e ampliação da possibilidade de acordos entre acusados e Ministério Público.

— A ideia é apresentar esse projeto num prazo breve ao Congresso —disse Moro, afirmando que a proposta está aberta a sugestões.

O ministro apresentou o projeto para um grupo de 12 governadores e representantes de outros 13 estados. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEMAP), anunciou que criará uma comissão para acompanhar a discussão do projeto na Câmara. A ideia é acelerar a tramitação do pacote para quando chegar ao Senado. Leia abaixo 15 destaques das propostas.

Prisão após condenação em segunda instância

O Supremo Tribunal Federal (STF) autoriza hoje a execução da pena após condenação em segunda instância, mas não há lei que explicite isso. O tema divide o tribunal que, por placar apertado, vem mantendo a mesma orientação desde 2016. O projeto de Moro, se aprovado, deixa claro que esta será a regra e que, apenas excepcionalmente, a prisão não será efetuada após o julgamento em segunda instância. Defensores da execução da pena após o trânsito em julgado, ou seja, quando não são mais possíveis recursos judiciais, veem a medida como uma antecipação da pena.

Tribunal do júri

Permite o cumprimento de pena após condenações pelo tribunal do júri, que julga crimes contra a vida, sem necessidade de esperar análise em segunda instância. Há precedentes no STF autorizando isso. O presidente da Corte, Dias Toffoli, também já se manifestou publicamente a favor dessa medida.

Excludente de ilicitude

O projeto não elimina a possibilidade de punição a um policial, a chamada exclusão de ilicitude, conforme defendia o presidente Jair Bolsonaro durante a campanha eleitoral. Mas permite que o juiz reduza a pena até a metade ou deixe de aplicá-la se o excesso decorrer de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Civis também podem ser beneficiados pela medida e ter penas reduzidas ou extintas nesses casos.

Plea bargain

É um modelo de justiça criminal comum nos Estados Unidos com possibilidade de acordo entre Ministério Público e acusados, em que estes se declaram culpados e conseguem benefícios sem a necessidade de julgamento. As penas poderão ser reduzidas até a metade e aplicadas de imediato. Mas criminalistas, juízes e estudiosos ouvidos pelo GLOBO alertam que, com receio de penas altas, inocentes podem ser compelidos a assumir delitos que não cometeram.

Corrupção

Condenados por corrupção passiva, corrupção ativa e peculato devem cumprir a pena inicialmente no regime fechado. Medidas de combate à corrupção já enfrentaram resistência no Congresso no passado, mas Moro acredita que o momento é outro, mais favorável à aprovação.

Caixa dois

Tipifica o crime de caixa dois, com pena de até oito anos de cadeia. Um ponto que poderia provocar polêmica foi descartado. Moro explicou que o caixa dois cometido antes da aprovação do projeto continuará sendo punido pela norma antiga, que tem punição mais branda. O endurecimento da pena só valerá para delitos ocorridos depois.

Crimes com arma de fogo e explosivos

Aumenta pela metade a pena em alguns crimes ligados ao porte e posse de arma de fogo. Roubos cometidos com arma de fogo ou explosivos terão início de cumprimento da pena em regime fechado. É um contraponto à flexibilização da posse de armamentos autorizada em decreto pelo presidente Jair Bolsonaro.

Crimes hediondos

Dificulta a progressão de regime para condenados em crimes hediondos e proíbe que eles tenham direito às saídas temporárias enquanto estão no regime fechado. Na campanha, Bolsonaro criticou os chamados “saidões” e as regras de progressão de pena.

Presídios federais

A comunicação com visitantes deve ocorrer apenas por meio virtual ou pelo parlatório, com uma parede de vidro os separando. O projeto também deixa claro que o tempo de permanência nos presídios federais poderá ser prorrogado repetidas vezes, não havendo na prática um limite de tempo. Permite ainda que os estados possam construir prisões de segurança máxima com as mesmas regras previstas nos presídios federais. As restrições a visitas íntimas e a longa duração do tempo em que presos ficam no sistema federal sem voltar a seus estados já levaram advogados a acionar a Justiça, mas, no geral, eles não têm obtido êxito.

Organizações criminosas e milícias

O projeto redefine o conceito de organização criminosa, incluindo os nomes de algumas facções, como o PCC e o Comando Vermelho, além de milícias e “outras associações”. Antecipando-se a críticas que pode receber por incluir nominalmente alguns grupos, e não simplesmente descrever a prática criminosa, Moro disse que a lei é feita procurando efeitos práticos, e não para agradar a professores de processo penal. Segundo Moro, esses grupos hoje já podem ser enquadrados como organizações criminosas, mas o projeto deixa isso mais claro.

Banco de DNA

Condenados por crimes dolosos (com intenção de cometer o delito) terão seu DNA recolhido no momento de ingresso no sistema penitenciário. Há questionamentos contra a medida porque violaria direitos dos presos, como a não produção de provas contra si mesmo. Moro argumenta que a coleta se assemelha a uma operação de busca e apreensão e destaca que a o material é recolhido com um cotonete passado na boca, sem violação à saúde ou integridade física.

Videoconferências

O texto amplia as possibilidades de uso de videoconferência em audiências envolvendo detentos. A ideia é agilizar processos e desafogar os governos que não têm estrutura pra fazer escoltas. Há quem entenda que a ampliação desse tipo de medida em detrimento das audiências presenciais afronta o direito à ampla defesa.

Apreensão de bens

Juízes poderão autorizar que agentes de segurança usem bens apreendidos em investigações criminais. Hoje policiais já costumam usar sobretudo carros apreendidos em casos relacionados a tráfico de drogas. Mas sem previsão legal explícita, essa prática tem provocado controvérsia. Em alguns casos, até resultam em processos por desvios de conduta.

Multas

Estabelece que o condenado deve pagar a multa imposta no prazo de dez dias após o início da execução definitiva ou provisória da pena. Hoje a lei fala em pagamento da multa apenas após o processo transitar em julgado. A controvérsia é semelhante à da prisão após condenação em segunda instância. Também é comum que, nos processos criminais, muitos presos não paguem suas multas.

Confisco de bens

Condenados a mais de seis anos de prisão poderão ter bens confiscados de acordo com a diferença entre aquilo que possuem e a quantia compatível com seus rendimentos lícitos.

O Globo