Artigo: Etanol e poluição

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Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular (PBEV) é uma iniciativa importante do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), que, em seu atual estágio, possibilita ao público consumidor conhecer o consumo de combustível de uma considerável gama de veículos flex e a gasolina. Também classifica esses veículos por meio de um índice, semelhante ao usado em eletrodomésticos. O programa ainda não abrange todos os veículos comercializados no país, pois a adesão das montadoras é voluntária e a seleção dos veículos participantes cabe a cada marca. Contudo, o governo federal estuda tornar a adesão compulsória nos próximos anos, o que é meritório, pois o consumo de combustível representa parcela significativa dos custos de operação de um veículo.
 
Complementarmente ao PBEV, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) tem um programa igualmente importante, chamado Nota Verde, que classifica os veículos leves de acordo com a emissão de poluentes. Os valores de consumo e emissão de poluentes são informados, respectivamente, nas páginas eletrônicas de cada uma das instituições. Com o intuito de facilitar a sua divulgação, essas informações deverão ser unificadas e apresentadas em um único selo, que auxiliará o consumidor a orientar sua compra de forma mais consciente. Além dessa ação, o governo federal estuda um novo regime automotivo para o país, que deve condicionar a definição das alíquotas de impostos para os veículos novos com base em critérios de inovação tecnológica, visando incrementar a inovação tecnológica e concorrência entre as montadoras para oferta de produtos cada vez mais eficientes e menos poluidores.
 
O momento é oportuno para reflexão, propostas e críticas. A paridade entre etanol e gasolina, comumente aceita como sendo 70%, poderia ser considerada como parâmetro a ser aumentado para 75%, tornando assim o uso do etanol mais competitivo. Isso não somente é desejável como possível, uma vez que existem no mercado veículos que já atingem essa relação ou estão próximos dela. Vale lembrar que a introdução da tecnologia de motores flex no Brasil foi baseada em larga escala no conceito da não modificação do motor a gasolina original, de modo que o foco do desenvolvimento tecnológico foi direcionado para a funcionalidade do sistema e atendimento aos requisitos de emissões. Efetivamente, houve então pouca preocupação em otimizar o consumo do etanol em relação ao da gasolina.
 
Com a expansão das vendas de carros no Brasil, o rápido crescimento do mercado de veículos flex e a preferência que o etanol passou a ter em diversas regiões, algumas montadoras lançaram modelos com menor consumo de etanol. São veículos com taxas de compressão mais elevadas, que aproveitam melhor a elevada octanagem do etanol e proporcionam melhor rendimento térmico do motor. Esses modelos também são equipados com sistemas eletrônicos mais avançados de injeção de combustível e de controle de vários parâmetros do motor, possibilitando uma calibração mais apurada.
 
A proposta, portanto, é evoluir mais. A adoção de inovações tecnológicas pode resultar em aumento no custo do veículo, entretanto é aí que entra o poder regulatório do governo federal possibilitando, por meio de diferenciação na cobrança do imposto, incentivos para redução ou eliminação desses custos adicionais, como ocorreu recentemente no caso do aumento dado ao preço da gasolina e sua imediata compensação com a redução do tributo.
 
Outra questão que merece atenção é a forma como se pretende apresentar a emissão de gás carbônico (CO²) no selo a ser aplicado nos veículos. É aceito internacionalmente que a emissão do CO² originado da combustão de etanol produzido de forma sustentável, como ocorre no Brasil, é praticamente nula quando se considera o ciclo de vida do combustível. Entretanto, de forma contraditória à posição do governo federal nos foros internacionais, que defende essa tese, ganha corpo em setores do mesmo governo a ideia de divulgar no selo somente a emissão de CO² medida no gás de escapamento, buscando criar uma equiparação entre CO² de origem renovável, associado ao etanol, com o de origem fóssil, resultante da queima da gasolina.
 
Acontece que, enquanto o etanol possibilita a neutralização dessa emissão por meio da fotossíntese da cana, os derivados de petróleo não têm um sumidouro natural, o que torna a referida comparação um sério equívoco. Nesse caso, é imperativo fazer uma correção de rumo, pois do contrário a sociedade receberá uma informação incompleta, que pode levar a erro de julgamento de um dos principais benefícios ambientais do etanol, podendo até comprometer a confiabilidade do próprio selo.
 
 
*Engenheiro mecânico, mestre em controle da poluição ambiental e consultor técnico da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica)
Estado de Minas