Os novos fiscais virtuais

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Uma série de movimentos de consumidores monitorando preços nas redes sociais mostra que o fantasma da inflação voltou a rondar o brasileiro. Com a alta acumulada do IPCA, índice oficial de inflação, de 4,04% no ano e 6,87% em 12 meses — a maior desde junho de 2005 e superior ao teto da meta oficial de 6,5% — cresce a função social de "twitteiros" e "facebookeiros" do consumo. Donas de casa, motoristas e estudantes usam a rede para fazer denúncias, dar dicas de preços e descontos em produtos e serviços.

As mesmas donas de casa que invadiram supermercados de calculadora e tabela de preços em punho na década de 80, e ficaram conhecidas como as "fiscais do Sarney", agora se valem da internet. O Movimento das Donas de Casa de Minas Gerais (MDC-MG) — ícone daquela geração — ganhou em abril uma página no Facebook, que se somou a seu perfil no Twitter e a um canal no YouTube. O movimento espera turbinar o alcance de suas pesquisas mensais de preços de serviços e produtos essenciais, como arroz e feijão em Belo Horizonte.

A idéia de levar o MDC para a internet partiu de Laís Menini, hoje coordenadora de redes sociais. O objetivo é interagir e "linkar" gerações atraindo o interesse de jovens que moram sozinhos e têm pouco tempo e dinheiro. Aos 24 anos, Laís não viveu o período de hiperinflaçâo e diz que lembra vagamente da criação do real. Sua mais árdua tarefa foi convencer a fundadora do MDC-MG, Lúcia Pacífico, de 75 anos, da importância da internet.

— Tive resistência, mas me surpreendi. Se isso (redes sociais) existisse há 27 anos, teria economizado muita sola de sapato e minha garganta — brinca Lúcia.

O MDC fará em setembro um curso de internet para donas de casa na faixa etária dos 70 anos aos 80 anos. Experiente militante dos preços, Lúcia se preocupa com a escalada da inflação de alimentos e produtos de higiene e limpeza. Além das pesquisas em supermercados, o grupo intensificou a divulgação de dicas sobre como substituir alimentos caros, como a carne bovina, por outros mais baratos.

Um dos alvos prediletos dos in-ternautas tem sido os preços dos combustíveis. Na semana passada, declarações do presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, quanto a um possível aumento da gasolina geraram reação imediata. Em abril, a queda de braço entre a estatal e o governo levaram o marcador #combustivel-maisbaratoja a liderar por três dias seguidos os Trending Topics (TTs) brasileiros, a lista dos assuntos mais comentados no Twitter.

No dia 7 de abril, o marcador #boicotepostosbr alcançou o segundo lugar dos TTs. A preocupação não é infundada. Na última ata, o Copom projetou alta de 4% da gasolina em 2011.

O estudante Júlio Silva, de 24 anos, criou há dois anos o perfil @Pos-tosManaus no Twitter. Ele também está no Facebook e no novíssimo Google+. O modelo é colaborativo, semelhante ao do Twitter da Lei Seca. Os mais de 4 mil seguidores tuítam os melhores preços em postos de Manaus e fiscalizam a qualidade do combustível.

Facebook e Twitter também têm sido usados para convocar protestos como o "Não ao aumento do preço da gasolina!", no início do ano. Com mais de 28.289 manifestações de apoio, ele propunha o boicote aos postos da BR, distribuidora de combustíveis da Petrobras. Já o site Na Mesma Moeda sugere que consumidores façam carreatas até os postos, abasteçam R$ 0,50 e peçam a nota fiscal, boicotando seu lucro.

A rede de economia virtual não para na cesta básica. Em Fortaleza, o site A Preço de Banana divulga opções de atrações culturais locais gratuitas ou de até R$ 10. Tem mais de dois mil seguidores no Twitter. Já o blog de consumo Bazar Pop lista liquidações, lojas off, promoções e outlets. Só no Twitter tem 4.270 seguidores; no Facebook, 914 pessoas "curtiram" a ideia.

O Globo